SOBRE LÍNGUA, LINGUAGEM E LINGUÍSTICA –
UMA ENTREVISTA COM MÁRIO A. PERINI1
Mário A. Perini
Universidade Federal de Minas Gerais
Entrevistadores – O que é língua?
Perini – Chamamos “língua” um sistema programado em nosso cérebro que,
essencialmente, estabelece uma relação entre os esquemas mentais que
formam
nossa compreensão do mundo e um código que os representa de maneira
perceptívelaos sentidos. Os seres humanos utilizam um grande número de
tais sistemas(“línguas”), que diferem em muitos aspectos e também se
assemelham em muitos outros aspectos. Tanto as diferenças quanto as
semelhanças são altamente interessantes para o linguista.
O sistema em questão é de uma complexidade extrema: compreende regras
(de
pronúncia, de formação de palavras, de formação de frases, de
relacionamento das formas com os significados), itens léxicos (palavras e
morfemas, com suas propriedades gramaticais e seus significados),
expressões idiomáticas (como pisar na bola ou mãe de santo) e clichês
(como ficar sem fala e tomar café). Acredita-se hoje que o sistema é em
parte inato, pois todas as línguas parecem seguir determinadas linhas,
ou seja, não encontramos tudo o que seria possível, mas apenas algumas
das
possibilidades. A hipótese é que as línguas só se desenvolvem seguindo
certas direções por que de outra forma não seriam utilizáveis por
cérebros humanos. E parte do sistema, evidentemente, não é inato, e
precisa ser aprendido a partir de exemplos observados pela criança.
O que chamamos uma “língua” é, assim, uma das realizações históricas da
capacidade humana para a linguagem. E cada língua é profundamente
enraizada na cultura que serve – por exemplo, não creio que em tibetano
ou em amárico haja expressões exatamente paralelas a pisar na bola ou
mãe de santo. Já houve (não sei se ainda há)quem sustentasse que a
língua que uma pessoa fala condiciona sua maneira de ver o mundo (a
chamada “hipótese de Sapir-Whorf”). Suspeito que há um grão de verdade
nessa hipótese, mas do modo como é geralmente enunciada ela exagera a
importância da língua nos nossos processos cognitivos.
Entrevistadores – Qual a relação entre língua, linguagem e sociedade?
Perini – Posso começar dizendo que a relação entre língua e linguagem é
que uma “língua” é uma das maneiras como se manifesta exteriormente a
capacida de humana a que chamamos “linguagem”. Mas o termo linguagem é
também aplicado a outros tipos de sistemas de comunicação, que
normalmente não são chamados línguas,como o sistema de sinais de
trânsito e a linguagem das abelhas. Assim, linguagem é um conceito muito
mais amplo do que língua: a linguagem inclui as línguas entre suas
manifestações, mas não apenas as línguas.
Agora, dito isso, podemos afirmar que as relações entre a linguagem (em
geral sob a forma das línguas) e a sociedade humana são muitas e muito
importantes. Primeiro,observemos que qualquer sociedade minimamente
complexa só pode funcionar, e mesmo surgir, através do uso intensivo da
linguagem. A sociedade funciona através da cooperação e/ou conflito
entre os homens, e a linguagem medeia esses processos de maneira
crucial.
A língua falada por um povo é parte da imagem que esse povo tem de si
mesmo, em certos casos ainda mais significativa do que as unidades
políticas em que o povo se organiza. Assim, embora a Alemanha e a Itália
só se tenham unificado como nações nos meados do século XIX, havia
muitos séculos já que os falantes das respectivas línguas se
consideravam “alemães” e “italianos”. Pode-se mencionar também fatos
atuais como a atitude dos catalães e dos bascos, que insistem em ser
diferentes dos demais espanhóis, em grande parte por falarem outra
língua. Vemos aí uma tendência a fazer coincidir as fronteiras
linguísticas com as fronteiras nacionais. Isso nem sempre acontece, como
se pode ver pela persistência das fronteiras entre os países
hispano-americanos, mas mesmo assim um mexicano se sente culturalmente
mais próximo de um espanhol ou de um uruguaio do que de seus vizinhos
americanos falantes de inglês. A língua é, sintomaticamente, um dos
instrumentos mais importantes na mão de governantes que, para bem ou
para mal, procuram enfatizar a unidade de um povo ou de uma nação.
Entrevistadores – Há vínculos necessários entre língua, pensamento e
cultura?
Perini – Entre língua e pensamento certamente há. Apesar de a língua ser
primariamente um instrumento de comunicação (ao contrário do que dizem
alguns,ver a questão 5), ela é também um instrumento de pensamento. Ou
seja, podemos utilizar a língua para pensar, e constantemente o fazemos.
Não acredito que a língua que uma pessoa fala condicione em grande
medida sua maneira de pensar (contradizendo a chamada hipótese de
Sapir-Whorf, mencionada na questão 1); mas acho perfeitamente plausível
que haja alguma influência da língua sobre as categorias através das
quais compreendemos o mundo. Já se fez algum trabalho sobre isso – por
exemplo, sustenta-se que os falantes de certas línguas categorizam as
cores de maneira diferente dos falantes do português, e isso se reflete
em sua língua. Os russos distinguem duas cores no que chamamos de azul
(goluboy “azul claro”, sinniy “azul escuro”); isso não quer dizer que
eles vejam essas cores diferentemente, mas certamente sugere que eles
“organizam” diferentemente esse detalhe da realidade.
Mas o verdadeiro vínculo entre língua e pensamento é que o conhecimento e
o uso da língua são também formas de pensamento. Ao usarmos uma língua,
lançamos mão de conhecimentos não apenas linguísticos stricto sensu,
mas de todo tipo de conhecimento sobre o mundo. Por exemplo, podemos
dizer animal mamífero, mas não mamífero animal, porque se entende que
todo mamífero é animal, e o termo mais restritivo deve sempre aparecer
depois do menos restritivo. Nesse caso, a ordem das palavras não é
determinada apenas pelo nosso conhecimento da língua, ou seja,da
gramática, mas também pelo que sabemos sobre o mundo animal. Os exemplos
são muitos, e mostram que não existe uma fronteira nítida entre nosso
conhecimento da língua e nosso conhecimento do mundo. A meu ver, existe
uma fronteira aproximada entre esses dois tipos de conhecimento, o que
nos autoriza a continuar
falando de conhecimento linguístico, de gramática etc., mas não se trata
de um limite entre componentes estanques, porque os pontos de
interrelação são muitos.
Quanto aos vínculos entre língua e cultura, existem porque a cultura
inclui
manifestações de base linguística, como a literatura (oral e escrita), o
humor, as fórmulas e rituais para as diversas ocasiões da
vida(nascimento, funeral, casamento,encontros na rua etc.), e todas
essas manifestações são marcadas por expressões linguísticas especiais. A
poesia, por exemplo, utiliza certos tipos de métrica, rima, aliteração
etc., que são específicas de cada língua. Além disso, a poesia lança mão
constantemente de associações que são específicas daquela cultura, e
que deixam de funcionar quando traduzidas: pode-se lembrar, por exemplo,
como é difícil para um ocidental perceber a beleza poética dos hai-kais
japoneses quando traduzidos. E me lembro de um poema que dizia que a
flor é a casa do perfume, que um colega francês achou horrível porque
ele percebia a palavra maison (“casa”) como um termo excessivamente
concreto, terra-a-terra, que só lhe evocava tijolos, reboco, janelas e
portas.
Entrevistadores– A linguagem tem sujeito?
Perini – Sinceramente, não compreendo a pergunta. A palavra “sujeito”
vem
assumindo uma gama tão extensa de significados que não vejo como
responder sem que pelo menos 50% dos leitores achem que estou fugindo ao
tema. Vamos definir direito o que se entende por “sujeito”, e aí talvez
eu possa responder.
Entrevistadores – O que é linguística?
Perini – A linguística é uma tentativa de descrever e compreender um
fenômeno muito misterioso: uma pessoa pode comunicar a outra certas
idéias através de sinais sensorialmente perceptíveis. Em outras
palavras, é o estudo dos códigos usados pelas pessoas para se
comunicarem, e da capacidade inata que nos permite levar a efeito essa
atividade.
Alguns linguistas importantes, como Chomsky, sustentam que a função
comunicativa da linguagem é secundária, e que a linguagem existe
principalmente para permitir o pensamento. Isso cria uma dificuldade na
base da metodologia linguística: se nos basearmos em enunciados
observados para estudar as línguas (e, daí, a linguagem),estaremos
usando dados provenientes de um uso marginal do fenômeno estudado. Mas,
se quisermos partir de dados relacionados com o uso essencial da
linguagem (segundo eles, o pensamento), teremos que nos limitar à
introspecção – e acho que
nenhum linguista sustentaria seriamente essa alternativa.
O dilema, porém, é só aparente, porque a linguagem é mesmo,
fundamentalmente,um instrumento de comunicação. É possível pensar sem
utilizar a linguagem, mas não é possível se comunicar sem utilizar
(algum tipo de) linguagem.Devo acrescentar que a fonte principal dos
dados do linguista, mesmo daqueles que se ocupam da teoria geral da
linguagem, está nas línguas naturais (português,caxinauá, húngaro e
alemão, por exemplo). O estudo das línguas naturais,consideradas em si
mesmas, é a base de todo o estudo linguístico. Digo isso porque já ouvi
linguistas afirmarem que o estudo das línguas naturais é relativamente
pouco interessante para o que entendem por “linguística”. É uma atitude
que não apoio, e que considero fora da realidade.
Além desse estudo basicamente estrutural, a linguística também estuda a
evolução histórica das línguas, as variantes que uma língua mostra
segundo seu uso pelas diferentes classes sociais, as variantes
regionais, o processo de aquisição da linguagem pelas crianças e vários
outros aspectos da estrutura e do uso das línguas. Há também um esforço
no sentido de descobrir os traços comuns a todas as línguas,com a idéia
de que eles são evidência de aspectos da programação inata que nos
permite adquirir e utilizar uma língua natural. Acrescente-se a tudo
isso a procura de aplicações dos resultados da linguística à solução de
problemas práticos, em especial ao ensino de línguas.
Entrevistadores – A linguística é ciência?
Perini – Acho que sim, em princípio, mas tenho restrições quanto à
maneira como alguns linguistas entendem esse “status” de ciência. Talvez
o melhor seria dizer: a linguística pode ser uma ciência, dependendo de
como a praticarmos. Se é uma ciência, é sem dúvida uma ciência
empírica, ou seja, empenhada em descrever um aspecto do universo e em
construir teorias que expliquem os fenômenos descritos. Esses dois
aspectos são fundamentais: não há ciência sem descrição sistemática de
aspectos da realidade, e não há ciência empírica sem teorias que
procurem explicar esses aspectos em termos mais gerais – sempre que
possível, relacionando-os com teorias de outras ciências que se ocupam
de aspectos correlacionados. São duas faces
de toda e qualquer ciência empírica, e uma não pode existir sem a outra,
sob pena de prejudicar o caráter científico da atividade em questão.
Alguns linguistas atuais, entretanto, parecem convencidos de que é mais
importante criar teorias do que descrever fatos de maneira sistemática,
precisa e escrupulosamente fiel aos dados da observação. O resultado, a
meu ver, é uma nãociência (para não ser malvado e dizer uma
“pseudo-ciência”). Mas o problema não está no caráter da linguística;
está na compreensão a meu ver falha que alguns linguistas têm do
trabalho científico.
Uma atitude deletéria que observo na linguística atual é a de enfatizar a
produção,discussão, crítica e releitura de textos teóricos (sejam
recentes, sejam clássicos), sem uma ênfase paralela na sua validação
frente a dados reais. Isso tende a reduzir a atividade linguística a uma
crítica textual sem conteúdo empírico, e portanto não científica. Não
estou dizendo que não se deva ler Saussure, Chomsky ou Pânini; mas é
fundamental reconhecer que esses autores, e todos os outros, só têm
relevância para a linguística moderna se puderem sugerir novos meios de
abordar o estudo da realidade das línguas naturais.
Para resumir, a linguística é uma ciência na medida em que se ocupa
sempre, em última análise, do estudo de dados reais, tirados do uso
normal das línguas.
Entrevistadores – Para que serve a linguística?
Perini – A linguística, como toda ciência, serve para aumentar nosso
conhecimento e nossa compreensão de alguns aspectos do mundo.
Por outro lado, ela pode ter aplicações (ver questão 8), mas estas não
fazem parte de sua fisionomia fundamental; são decorrências acidentais.
Mal comparando, ficamos muito felizes em saber que a química permite a
criação de medicamentos; mas não se pode dizer que a química tem como
objetivo a fabricação de remédios. O que a linguística faz, e o que faz
dela uma ciência, é descrever e (na medida do possível)explicar o
fenômeno da linguagem.
Entrevistadores – A linguística teria algum compromisso necessário com
a educação?
Perini – A linguística, como ciência, não tem compromisso com a
educação. Já os linguistas, como cidadãos, devem ter, e geralmente têm,
um grande compromisso com a educação. As principais aplicações do
conhecimento linguístico se voltam para questões educacionais. Por isso,
na prática, a linguística e a educação se ligam bem de perto. É mais ou
menos como a relação que existe entre a física e a engenharia mecânica:
a fabricação de máquinas não faz parte do objeto da física, mas
conhecer física é essencial para um engenheiro mecânico.
Muitos linguistas se preocupam com as aplicações de sua disciplina a
problemas educacionais, e podem mostrar alguns resultados importantes,
notadamente na área do ensino de línguas estrangeiras. Já no que diz
respeito ao conjunto de habilidades que se tenta transmitir sob o rótulo
de “língua portuguesa”, as contribuições estão em grande parte ainda no
reino das potencialidades. Acho que poderíamos dar uma contribuição
significativa ao desenvolvimento de áreas como a aquisição da leitura
fluente, o ensino de gramática, o conhecimento da realidade linguística
do Brasil e o desenvolvimento das habilidades de redação (“produção de
textos”, no jargão atual).
Mas acho que pouca gente tem se dedicado intensivamente a esses
problemas –em oposição à linguística aplicada ao ensino de línguas
estrangeiras, que é uma área bem estabelecida, com seus especialistas
próprios, revistas especializadas, programas de pós-graduação etc.
É preciso observar que quando se pensa em aplicação da linguística à
educação é indispensável pensar em termos interdisciplinares. Digo isso
porque tenho visto ocasionais tentativas de aplicação direta e crua de
conceitos teóricos ao ensino, com resultados desastrosos. Posso citar,
em tempos idos, a tentativa de criar uma metodologia transformacional de
ensino de línguas, e atualmente a aplicação indevida dos estudos de
universais linguísticos a problemas de sala de aula. Não se pode perder
de vista que o ensino é uma questão didática, pedagógica, não
linguística; e que o valor de uma metodologia se mede em termos de
resultados, e não de inserção nas teorias do momento.
Eu gostaria de ver um número maior de linguistas de primeira linha
ativamente engajados no desenvolvimento de aplicações da nossa ciência a
questões educacionais – e gostaria igualmente de ver maior
receptividade da comunidade escolar às inevitáveis inovações que daí
resultarão.
Entrevistadores – Como a linguística se insere na pós-modernidade?
Perini – O que é “pós-modernidade”? Já vi esse termo empregado em
diversos
sentidos, nenhum deles realmente interessante. Vou selecionar os três
que me parecem mais comuns, para tentar relacionar cada um com a
linguística de hoje.
Em um sentido, “pós-modernidade” se refere a um movimento que, me
parece, tem como objetivo subordinar o trabalho científico a
considerações de ordem ideológica, com o interesse de fazê-lo
politicamente correto. Por exemplo, criticou-se o uso da noção de
“comando” em sintaxe porque se trata de uma relação assimétrica, de base
autoritária e não-democrática – não estou brincando, vi isso em um
artigo na revista Natural language and linguistic theory, se não me
engano de 1992. Ou podem negar a própria relevância do estudo da
fonologia por ser desvinculado de aplicações
políticas. Tudo isso seria apenas ridículo se não fosse levado a sério
por algumas pessoas bem intencionadas. Essa atitude, se levada adiante, é
destrutiva, eu diria mesmo anti-intelectual. Posições políticas, por
mais defensáveis que sejam, não são um substituto para o trabalho
científico, baseado no respeito aos fatos e na tentativa de organizá-los
dentro de teorias coerentes. Nesse sentido, a linguística (a que eu
pratico e defendo) não se insere de maneira nenhuma na
“pós-modernidade”.
No segundo sentido, parece que “pós-modernidade” se refere à tendência
de
abandonar a ideia de ciências autônomas para concentrar atenção nas
áreas
limítrofes, nas chamadas interfaces, negando-se às vezes a possibilidade
de
estabelecer limites. Isso não me parece novidade: é provavelmente uma
consequência inevitável do avanço do conhecimento. As áreas antes
consideradas marginais vão se integrando, à medida que produzem
resultados apreciáveis; por isso, hoje se estuda coisas como a
psicolinguística, a sociolinguística, a análise do discurso, a
pragmática etc., que eram muito pouco presentes nos programas quando fiz
minha pósgraduação, nos anos 70. Acredito que os limites ainda estão
aí, mas alguns deles estão menos nítidos, e pelo menos alguns podem não
subsistir por muito tempo; isso só o tempo vai dizer.
Como disse, não há nada de realmente novo nesse processo: aconteceu
sempre, e vai continuar acontecendo. É preciso encarar essa integração
com espírito crítico, pois há uma tendência a aceitá-la sem exame pelo
simples fato de estar na moda: a pesquisa linguística seria submetida a
uma cláusula de interdisciplinariedade compulsória. Essa é uma posição
ingênua, e aliás acontece que a maior parte do trabalho relevante em
linguística ainda se faz dentro das áreas e subáreas tradicionais. Mas
não há dúvida de que o processo de integração é real; para dar um
exemplo que afeta o meu trabalho, hoje é difícil justificar um trabalho
em sintaxe e semântica sem levar em conta os resultados da ciência
cognitiva. Só gostaria de enfatizar que para isso é preciso saber muito
bem sintaxe, semântica e ciência cognitiva.
Um terceiro sentido de “pós-modernidade” eu detecto na tendência, mais
observável no campo da análise do discurso, de adaptar à linguística
certas ideias sobre ciência em geral, às vezes conhecidas sob o rótulo
de “construtivismo social”. Em princípio,essa vertente enfatiza o
componente pessoal da atividade científica, e varia em grau de
radicalismo. Alguns autores apenas apontam que o cientista é um ser
humano, e que suas crenças e desejos podem influenciar seu trabalho; já
outros autores chegam a posições extremas, como a de negar que o
conhecimento objetivo seja possível,porque (segundo eles) a realidade
não é acessível à cognição humana – ou mesmo que a realidade não tem
existência objetiva, sendo um construto da mente humana. A primeira
dessas posições é, a meu ver, verdadeira, mas bastante óbvia. Já quanto à
segunda, o mínimo que posso dizer é que é auto-destrutiva: se a
realidade não existe, então as ideias desses autores (assim como os
próprios autores) também não existem, e onde é que vamos parar?
Não encontrei, na literatura linguística, tentativas sistemáticas de
aplicar essas ideias radicais de construtivismo social; em geral, o que
se encontra é apenas uma leitura e releitura infindável de textos, um
diálogo inteiramente intrateórico e, como é inevitável, empiricamente
estéril. O texto “linguístico” degenera em um exercício de estilo, com
uma procura constante de palavras e construções inusitadas, com o
objetivo evidente de causar efeito; o conteúdo é totalmente secundário. O
apelo aos dados é esporádico e puramente ornamental, e as conclusões
são atingidas sem argumentação verdadeira. Como já foi apontado, esses
textos têm mais em comum com a pregação religiosa do que com a
argumentação científica. Aqui não posso deixar de citar um comentário de
Peter Medawar (biólogo britânico – mas nascido em Petrópolis! –, prêmio
Nobel de Medicina) que viu no estilo desses autores “uma certa
semelhança com um balé, em que se faz uma pequena pausa de tempos em
tempos, em poses bem estudadas, à espera de uma explosão de aplausos”.
[in Dawkins, R. O capelão do diabo, p. 90]
É interessante observar que esses autores, que negam explicitamente a
possibilidade do conhecimento científico tal como se entende usualmente,
não deixam de utilizar (em geral inadequadamente) noções e termos da
ciência estabelecida. Vêm daí as frequentes alusões à física quântica e
as críticas ao “paradigma newtoniano” – noções que não se aplicam à
linguística, e que parecem ser utilizadas sem conhecimento de seu
significado nas áreas originais.
Como disse, a análise do discurso, aliás uma área perfeitamente
respeitável da linguística, é a que tem sido mais seriamente afetada por
esse tipo de problema. Em vez de estudar as condições de produção do
sentido no discurso, as eventuais interações entre as estruturas
gramaticais e as condições de uso das mesmas, a coesão e coerência dos
textos, as regras de retomada anafórica e outros temas que só podem ser
abordados no âmbito do discurso, algumas pessoas se desviam para estudos
literários (novamente uma área respeitável, mas profundamente infectada
por ideias não-científicas), ou para a verborreia pura e simples.*
*Falta um pequeno trecho da entrevista, não publicado aqui por falta de
espaço. Para ler a entrevista na íntegra, acessar o link abaixo:
http://revel.inf.br/site2007/_pdf/17/entrevistas/revel_14_entrevista_perini.pdf
Acesse o link abaixo para baixar materiais dos minicursos que a ABRALIN
ofereceu no início deste ano!!!
https://sites.google.com/site/abralincurtiba2011/materiais-dos-minicursos-do-xx-instituto
PSICOLINGUÍSTICA (verbete tirado do Dicionário on-line de Termos
Literários Carlos Ceia)
Data dos anos cinquenta do século XX – cf. o volume organizado por
Osgood e Sebeok (1954) – aquilo a que se poderia denominar o “acto de
nascimento”/a “certidão de baptismo” de um novo domínio
interdisciplinar: a psicolinguística (PL). Slama-Cazacu (1972, p. 14)
lembra ainda, contudo, que já em 1951 se tinha realizado, na
Universidade de Cornell, sob a égide do Social Science Research Council,
um seminário que contou com a presença de especialistas de psicologia e
de linguística e que tinha em vista clarificar as relações entre as
duas ciências. Bronckart et alii (1983, p. 268), por sua vez, apontam
1952 como sendo a data da fundação oficial da psicolinguística, “criada”
por Osgood, Carroll e Miller.
O objecto de estudo em questão – a saber: a linguagem, a comunicação –,
em virtude da variedade de aspectos que abrange, desencadeou a
necessidade de se proceder a uma abordagem que apostasse em perspectivas
complementares. Surge desta forma uma nova ciência em resultado dos
desafios lançados pelos novos modos de encarar esse objecto de estudo.
Não surpreende, portanto, que a 1 de Dezembro de 1953, data do prefácio à
monografia “Psycholinguistics. A survey of theory and research
problems”, organizada por Osgood e Sebeok (1954), os autores o concluam
nestes moldes: “Aussi c'est avec quelque inquiétude que nous offrons ce
plan grossier de ce qui devient un important sujet de recherche – la
psycholinguistique” (Slama-Cazacu, 1972, p. 39).
Convirá, desde já, trancrever a definição (de trabalho) que era então
proposta para a psicolinguística: “«psycholinguistics deals directly
with the processes of encoding and decoding as they relate states of
messages to states of communicators»” (Osgood e Sebeok, orgs., 1954, p.
4, cit. por Slama-Cazacu, 1972, p. 14.)
Com efeito, o termo “psicolinguística”, que se considera de um modo
geral cunhado nos anos cinquenta do século XX e com origem nos Estados
Unidos, “refletiu uma necessidade real na evolução das ciências”
(Slama-Cazacu, 1979, p. 35). Poderá concluir-se, com Slama-Cazacu, que
“não foi apenas um nome que ensejou uma disciplina nova” (Slama-Cazacu,
1979, p. 35). Quer isto dizer que na primeira metade do século XX, e já
mesmo no século XIX (cf. Slama-Cazacu, 1972, pp. 11 e ss.; 1979, pp. 34
e ss.), a linguagem, por força da complexidade que lhe era própria,
merecera já uma atenção muito particular na Europa por parte de variados
estudiosos. Acontece, porém, que no volume organizado por Osgood e
Sebeok (1954), conforme lembra Titone (1979, p. 22), “La
psycholinguistique y apparaissait mieux définie dans son concept
essentiel, dans ses méthodes et dans ses limites. ”
Após a segunda guerra mundial, sentia-se que era urgente constituir uma
nova disciplina. Segundo Slama-Cazacu (1972, p. 14), “Quand notre siècle
fêtait son cinquantenaire, cette idée était donc «dans l'air».” O facto
de algo «estar no ar» justifica também de certa forma a imagem usada
por esta autora e por Titone quando se referem, em obras distintas, aos
anos cinquenta do século passado como sendo os anos da adolescência
desta disciplina. Slama-Cazacu (1972, pp. 7-8) afirma: “La
psycholinguistique, en vérité, n'est pas seulement jeune: elle possède
les traits de l'adolescence.” Por sua vez, em Titone (1979, p. 22)
lê-se: “La psycholinguistique devint adolescente à la publication des
actes d'un célèbre symposium qui se tint à l'Université de l'Indiana
(1953), et édités par un psychologue et un anthropologue linguiste,
Osgood et Sebeok (1954).”
Não é pois de admirar que o percurso que se possa vir a traçar da
Psicolinguística (PL) a partir do seu surgimento “oficial” (Osgood e
Sebeok, orgs., 1954) não se apresente despojado de conflitos que, na
continuidade da imagem que é avançada por Slama-Cazacu e por Titone,
também afectariam fases de crescimento para lá dos próprios da
adolescência. Efectivamente, o quase meio século de existência oficial
da PL espelha o traçado de um domínio de pesquisa que, depois de ter
vivido épocas marcantes em termos de escolas/gerações (“stages”, nas
palavras de Titone, 1995, p. 42) defensoras de perspectivas teóricas
distintas (mais ou menos preponderantes do ponto de vista psicológico ou
linguístico, não excluindo a importância por vezes conferida ao
contexto social da linguagem e da comunicação), chega curiosamente aos
nossos dias também com a designação de “multidisciplinarily connected
science” (Slama-Cazacu, 1995). Slama-Cazacu afirma mesmo que “«Future
Psycholinguistics (and the present one included) will be
multidisciplinarily connected, or it will not exist at all».”
(Slama-Cazacu, 1995, p. 10).
Assumir a PL nas suas conexões multidisciplinares, ou seja, “involved
due to the form (oral/written) of communication and to the channels or
instruments used for conveying it” (Slama-Cazacu, 1995, p. 18), implica
questionar o grau de alcance da interdisciplinaridade (linguística e
psicológica) que sempre defendeu como garante da sua autonomia, bem como
repensar a actualidade dessa mesma interdisciplinaridade (cf.
Slama-Cazacu, 1979, p. 37; 1995, p. 13).
Se a PL se apresenta hoje como uma “multidisciplinarily connected
science” torna-se quase compulsivo adoptar uma posição segundo a qual a
PL e a Psicolinguística Aplicada (PLA) se devem entender numa
complementaridade que surge como um necessário. A este respeito,
Slama-Cazacu (1979, p. 37) avança: “(...) ligamos a PL teórica e as
pesquisas fundamentais a uma PLA, por nós desenvolvida de forma
tentativa e que procuramos fazer desenvolver ainda mais.” E Prucha
(1994, p. 150) acrescenta: “Provided we accept the concept which has
been developed by some European psycholinguists (...) as the base of
psycholinguistic research, then the applicability is included as an
inherent quality of psycholinguistics.” (Ver igualmente sobre este
tópico Mininni e Stame, 1994, p. 10.)
Uma tal concepção da PL obriga a que se (re)conheçam as áreas que com
ela partilham o interesse pelo que se passa nos processos de codificação
e descodificação de mensagens das mais diversas índoles, tendo em
consideração “a situação real da comunicação no contexto relacional e
dinâmico das trocas entre emissor(es) e receptor(es)” (Slama-Cazacu,
1979, p. 62). Esta tomada de posição requer também que se esteja atento
aos avanços gerais de ordem teórica e tecnológica no sentido de se tirar
o maior partido de tais abordagens multidisciplinares. (No tocante à(s)
(novas) tecnologia(s), ver, entre outros: Slama-Cazacu, 1979, p. 65;
Mehler e Noizet, 1974, p. 22; Pinto, 1999; Journal of Psycholinguistic
Research, 30 (3), 2001.)
De entre as áreas de pesquisa sobre as quais recaem as aplicações da PL,
poderão destacar-se, a título exemplificativo, a compreensão e produção
do discurso, a aquisição da língua materna, a aprendizagem de línguas
estrangeiras, a linguagem e a educação, os aspectos não-verbais da
comunicação, a tradução, a semiótica numa perspectiva psicolinguística, o
bilinguismo/plurilinguismo, a linguagem e o poder, os distúrbios e a
terapêutica da linguagem, a análise do texto literário, as tecnologias
da fala e os modelos da comunicação humana, os meios de comunicação de
massas, as novas tecnologias e a comunicação verbal, etc. (ver, entre
outros: Slama-Cazacu, 1994, p. 207; Slama-Cazacu, 1995; Pinto, 1999, pp.
1-5; Pinto et alii, orgs., 1999; Zafiu, 2001). Realçaria neste contexto
a preocupação, no âmbito do método dinâmico-contextual de Slama-Cazacu
(1972, 1979, 1984), de considerar a análise dos textos literários quando
se referem as áreas de aplicação da PL (ver ainda: Mey, 1994;
Scliar-Cabral, 1988a, 1988b, 1989, 1991a, p. 152, 1991b, 1991c, 1992), e
o facto de Slama-Cazacu (1979, p. 71) insistir nos benefícios
advenientes para a estilística das análises e dos experimentos
psicolinguísticos.
Algumas das áreas enumeradas possuem naturalmente um objecto de estudo
próprio; no entanto, lucrarão por certo se vierem a ser também abordadas
de um ponto de vista psicolinguístico. Gera-se, assim, como sugere
Slama-Cazacu (1995, p. 20), “a «dynamic» analysis from both sides por um
lado, a PL dando mais atenção à relação que mantém com outras áreas, e,
por outro lado, essas áreas reconhecendo que podem convergir para a PL,
beneficiando com esse movimento: centrifugal and centripetal, when
taking Psycholinguistics as a reference point.”
A perspectiva até aqui esboçada remete para o método psicolinguístico
defendido por Slama-Cazacu, o já referido método dinâmico-contextual
(Slama-Cazacu, 1972, p. 155), atendendo ao cunho explicativo da
disciplina em causa (Slama-Cazacu, 1979, p. 63) e ao seu interesse pela
aplicação das generalizações a que chega (Slama-Cazacu, 1979, p. 63). Na
verdade, para esta autora “o objeto da PL inclui a mensagem, mas o
estudo da mensagem implica a necessidade de se tomar em conta, como
ponto de partida, a situação real da comunicação no contexto relacional e
dinâmico das trocas entre emissor(es) e receptor(es), por seu turno,
determinadas pelo conjunto situacional, pelo contexto compreendido tanto
stricto sensu quanto em sua acepção mais ampla” (Slama-Cazacu, 1979,
pp. 61-62). (Relativamente ao contextualismo, ver Moerk, 1994.)
Esta opção pelo objecto e metodologia focados confere à PL a autonomia
que sempre buscou para se impor enquanto domínio/área/disciplina/ciência
(cf., entre outros: Bronckart, 1977, pp. 279-294; Bronckart et alii,
1983, p. 272; Slama-Cazacu, 1979, p. 37, e 1995, pp. 11 e ss.).
Considerar a PL uma “unitary science” (Slama-Cazacu, 1995, p. 13), “a
truly interdisciplinary endeavor” (Slobin, 1979, p. 2), traduz sem
dúvida a forma mais adequada de a assumir. De resto, a PL surge, em
parte, para efectuar uma abordagem distinta da até então levada a cabo
pela psicologia da linguagem (Bronckart, 1977, p. 249). Deve pois ler-se
com precaução toda e qualquer passagem em que se veja identificada a PL
(“approche du comportement langagier intégrant les analyses formelles
de la linguistique aux modèles psychologiques, tant pour la formation
des objectifs de recherche que pour l'interprétation des données
expérimentales.” (Bronckart, 1977, p. 249)) com a psicologia da
linguagem (“cette (…) discipline est centrée essentiellement sur le
langage en tant que conduite, ou comportement, et elle l'analyse en se
référant exclusivement aux modèles de la psychologie générale.”
(Bronckart, 1977, p. 249)). Slama-Cazacu refere em 1985, p. 507: "My own
opinion, which I have expressed since the 1960s (...), is that
Psychologie du langage (...) and Psycholinguistics are two different
names, for two different fields: the first being an area (a branch) of
Psychology, the second being an interdisciplinary field, an autonomous
discipline (neither a branch of linguistics nor a branch of
psychology)." (Ver ainda: Battacchi, 1964, referido por Slama-Cazacu,
1972, pp. 135-137; Slama-Cazacu, 1972, p. 23, e 1983, pp. 373 e ss.)
Todavia, essa “identificação” pode ser vista, por exemplo, em Jakobson
(1969, referido por Slama-Cazacu, 1985, p. 506; 1970, referido por
Slama-Cazacu, 1972, p. 72), em Titone (1979, p. 20), em Hörmann (1971,
referido por Slama-Cazacu, 1985, p. 506), e, de uma certa maneira, no
próprio título da obra de Foss e Hakes (1978).
De um modo extremamente lúcido, Fraisse (1963) interroga-se sobre o que
pode ter de moderno o termo “psycho-linguistique”. E acaba por
acrescentar que não pensa que esse termo queira unicamente substituir
“psychologie du langage” ou “langage et pensée”. Para o autor, está
antes em causa o “développement d'un secteur nouveau de recherches et de
préoccupations qui a pour origine le développement parallèle et
complémentaire de la linguistique et de la psychologie” (Slama-Cazacu,
1972, p. 55).
Por sua vez, Mehler e Noizet (1974, p. 7) afirmam a este propósito:
“Psychologie du langage, psychologie linguistique, psycholinguistique,
il peut paraître vain de substituer un terme à un autre pour désigner un
champ de recherche qui (...) reste fondamentalement le même. (…) Mais
un changement d´étiquette peut signifier aussi une transformation ou un
renversement des relations entre disciplines voisines. De ce point de
vue, chacun est conscient de l'importance fondamentale (...) de la
conception que l'on se fait des relations entre psychologie et
linguistique.” Afirmam ainda estes autores que toda a história da PL
poderia assentar na história das relações entre a psicologia e a
linguística.
Que se passava então antes do surgimento da psicolinguística, na
qualidade de disciplina nova?
O interesse pelo estudo da linguagem já existia obviamente antes dos
anos cinquenta e a consciência de que a linguagem era um objecto cuja
complexidade exigia uma abordagem interdiscipinar também se fazia
sentir. Acontece no entanto que, à altura, nem a psicologia apresentava
a metodologia mais adequada ao objecto de estudo em apreço, nem a
linguística tinha dado os passos imprescindíveis à compreensão da língua
como sistema (ver Slama-Cazacu, 1979, pp. 34 e 35). Até aos anos
cinquenta do século XX, isto é, até ao surgimento “oficial” da PL nos
Estados Unidos, dando assim origem à designada primeira geração/escola
da PL, os estudos no âmbito da psicologia da linguagem eram dominados,
segundo Slama-Cazacu (1979, p. 5), “por um método de análise
especulativa, impressionista, mais «filosofia» da linguagem que pesquisa
experimental e exata dos fatos concretos.” Quanto aos estudos no âmbito
da linguística, estes não tomavam como objecto o discurso. O “fenómeno
da comunicação” saía assim empobrecido nas duas perspectivas (cf.
Slama-Cazacu, 1979, p. 6). (Ver também Titone, 1979, pp. 28 e 29.)
A psicologia e a linguística não evidenciavam então a maturidade
suficiente para estabelecerem a colaboração desejada e para delinearem
os objectivos pretendidos (cf. Slama-Cazacu, 1979, p. 34). Mas a PL como
disciplina/ciência devia corresponder a um relacionamento franco, em
que ambas as disciplinas/ciências (psicologia e linguística), não
perdendo a sua autonomia, congregassem esforços no sentido de analisar
um objecto com implicações nos dois domínios. Reveste-se de oportunidade
transcrever a este respeito a seguinte passagem extraída do prefácio à
obra de Osgood e Sebeok (orgs., 1954), datado de 1 de Dezembro de 1953:
“Le développement de tout nouveau champ interdisciplinaire doit en fin
de compte dépendre de jeunes chercheurs qui réunissent dans un même
système nerveux les méthodes des deux sciences” (Slama-Cazacu, 1972, p.
39). Por sua vez, Slama-Cazacu (1979, p. 35) recorda que os
pesquisadores que se dedicavam então a estudos de ordem psicolinguística
não apresentavam, em regra, uma dupla formação em linguística e em
psicologia. Por outras palavras, poderiam ter sido realizados estudos
conjuntos apoiados na colaboração entre psicólogos e linguistas mas
raramente por investigadores com dupla formação, capazes de olhar o
objecto numa “fusão interdisciplinar” (Slama-Cazacu, 1979, p. 35. Ver
ainda Slama-Cazacu, 1972, p. 122.).
A recolha de dados e a sua interpretação constituem a metodologia que se
deve preconizar para esta nova disciplina. Trata-se, como sublinha
Slama-Cazacu (1972, pp. 156-157), de uma metodologia explicativa em que
os dois aspectos (recolha e interpretação) não podem estar dissociados.
Desta maneira, não podemos esperar da PL uma simples descrição dos
fenómenos linguísticos. Observação e experimentação constituem os
métodos de que esta disciplina se deve socorrer (Slama-Cazacu, 1979, p.
65).
A psicologia e a linguística, sobre as quais veio a assentar a primeira
escola de PL, ofereciam condições basicamente diferentes das existentes
antes da segunda guerra mundial (Slama-Cazacu, 1972, pp. 13 e 14). O
aparecimento da PL nos anos cinquenta permite-lhe tomar já como ponto de
partida a linguística estrutural, uma psicologia que se poderia dizer
renovada (“après le Gestaltisme (mais sans l'oublier), après les
critiques adressées au behaviorisme, après le développement de la
psychologie matérialiste (...), bénéficiant de l'efflorescence de
l'esprit interdisciplinaire, du remaniement du système général des
sciences par l'apparition des disciplines «de frontière».”
(Slama-Cazacu, 1972, p. 14)) e a teoria da informação, esta última
considerada por Slama-Cazacu (1972, p. 121) um auxiliar da PL – uma vez
que se encontra implicada tanto na psicologia como na linguística
moderna – e não um fundamento (teórico) da PL como ressaltaria da
monografia organizada por Osgood e Sebeok em 1954 (ver também
Slama-Cazacu, 1972, pp. 14 e 15).
A primeira escola de PL, dita “explícita” por Bronckart (1977, p. 250),
centrava-se, segundo o autor, “sur les processus de comunication,
qu’elle analisait en s’inspirant à la fois de la linguistique
structurale (...) et de la théorie de l’information”. Para Bronckart
(1977, p. 250), a importância conferida à função comunicativa da
linguagem por parte desta escola justifica e em parte também explica o
recurso à teoria da informação. Além disso, como acrescentam Bronckart
et alii (1983, p. 270), esta primeira escola de PL insere-se no contexto
skinneriano. Apesar de nela se ver introduzida a noção de mensagem,
comentam os autores que essa inovação não foi suficiente, na medida em
que não foram analisadas as categorias linguísticas e suas relações com o
sentido, nem as interacções sociais (Bronckart et alii, 1983, pp. 270 e
271). Mehler e Noizet (1974, p. 10) adiantam que a PL da primeira
geração mostrar-se-ia insuficiente sobretudo para aqueles que achavam
que nunca existiria ciência da linguagem na ausência de uma teoria da
linguagem.
Em meados dos anos cinquenta, os trabalhos de Chomsky iriam pôr em causa
a primeira escola de PL graças a um modelo linguístico que apresentava
uma axiomática da sintaxe assente em noções mais concretas e mais ricas
do que as propostas até então neste âmbito (Mehler e Noizet, 1974, p.
12). Nesta proposta de Chomsky, o que se revela mais importante, de
acordo com estes autores, é o facto de se verificar que “Chomsky
engageait la recherche en sciences humaines dans des directions
méthodologiques qui allaient se montrer très fructueuses” (Mehler e
Noizet, 1974, p. 12).
Estavam em causa, de acordo com a mesma fonte, uma redefinição da
sintaxe, que passava a ser generativa, mas sempre independente do
sentido, e uma redefinição do conceito de regra gramatical. Tratava-se
de uma gramática que não só procurava ter em conta a criatividade da
linguagem mas que também era capaz de fornecer uma descrição estrutural
de todas as frases geradas (Mehler e Noizet, 1974, p. 12). Dois níveis
linguísticos passam assim a existir: um nível de base e um nível de
superfície, ambos abstractos. Dito de outra forma, o pesquisador em
ciências humanas colocava-se agora, no dizer de Mehler e Noizet (1974,
p. 13), numa posição semelhante ao pesquisador que trabalha, por
exemplo, em física teórica. O salto qualitativo em termos de mudança de
orientação era incontestável. De facto, como continuam os autores
mencionados, “C'est que la construction d'un modèle formel donne
l'espoir d'assurer la cohérence de l'observable, et de le faire d'une
manière qui permette le contrôle par l'expérience. Aucune taxonomie des
faits ne peut aboutir à ce résultat” (Mehler e Noizet, 1974, p. 13).
Emana desta orientação uma forte influência da linguística sobre a PL. O
psicólogo passa a usufruir de um instrumento, de um modelo, em que se
poderá apoiar para explicar o comportamento real do locutor, a nível da
produção, da percepção, da compreensão e também no tocante aos processos
de armazenagem e de aquisição (Mehler e Noizet, 1974, p. 14). Trata-se
de uma leitura de ordem hipotético-dedutiva. A realidade psicológica da
gramática generativa passa a constituir uma interrogação que acompanha o
pesquisador, tomando como base, segundo Mehler e Noizet (1974, p. 14),
um modelo com carácter previsivo.
Desenha-se assim um terreno de pesquisa no qual actuam, por um lado, os
linguistas que se dedicam à construção do modelo e seu aperfeiçoamento,
e, por outro lado, os psicólogos que vão mostrar a sua validade a nível
de comportamentos. Na sequência desta posição, convirá referir, seguindo
a mesma referênca bibliográfica (Mehler e Noizet, 1974, p. 15), as
noções chomskyanas de competência (“ savoir de la langue, inhérent à
tout locuteur”) e de “performance” (“usage différencié que [o locutor]
en fait dans des situations concrètes”).
A construção do modelo de competência do locutor fica assim a cargo do
linguista. E, como adiantam os autores focados, resta ao psicolinguista
validar os modelos de competência, verificar a sua realidade
psicológica, restringindo-se assim à “performance”. Contudo, segundo
Mehler e Noizet (1974, p. 16), “La performance ne peut donc pas être
prise pour un reflet direct de la compétence.” A par da distinção entre
competência e “performance”, torna-se necessário salientar a distinção
entre sujeito ideal e sujeito real. Existe, com efeito, uma distância
entre estes dois sujeitos e o comportamento do locutor implica
limitações de ordem psicológica. Não supreende pois que os estudiosos
referidos (Mehler e Noizet, 1974, p. 18) na sequência do exposto alertem
para o facto de ser mais correcto falar de modelos ou sub-modelos de
“performance” do que de um simples modelo de “performance”.
Nesta óptica, o psicolinguista da segunda geração encontra-se muito mais
ligado à linguística, pelo que se afigura pertinente citar a seguinte
passagem de Mehler e Noizet: “En transposant la célèbre formule de
Piaget, on pourrait dire que face à la grammaire générative se
constituant comme axiomatique du langage, la psycholinguistique se
posait comme la science expérimentale correspondante” (Mehler e Noizet,
1974, p. 17).
Nesta linha de pensamento, Foss e Hakes (1978, p. 18) afirmam que a
tarefa principal da PL consiste em “Developing a theory of linguistic
performance, a theory of the psychological processes involving
language”, entendendo os autores que a teoria da “performance”
“describes the psychological processes involved in using our linguistic
competence in all the ways that we actually can use it — in producing
utterances, in understanding them, in making judgments about them, and
in acquiring the ability to do these things.”
Atendendo à perspectiva epistemológica de Chomsky, que defenderia o
carácter inato das estruturas da língua, a sua especificidade e o seu
carácter racional, Bronckart et alii (1983, p. 270) observam que tal
perspectiva se inscreve na concepção então em voga do “tout biologique”,
o que remete para um acentuar da tónica sobre os aspectos
representativos e estruturais da linguagem (cf. Bronckart et alii, 1983,
p. 271) em detrimento das relações que a língua deve manter com o
contexto e com as situações de enunciação. Não será pois de estranhar
que Foss e Hakes (1978) refiram que os que estudam a estrutura e os
processos mentais se designem por psicólogos cognitivos e que
consequentemente se possa considerar a PL um ramo da psicologia
cognitiva (cf. Foss e Hakes, 1978, p. xiii). Estava assim aberta a
vertente cognitivista que iria caracterizar certos estudos
psicolinguísticos subsequentes.
De uma forma que não deixa de ser interessante, Bronckart (cf. Bronckart
et alii, 1983, p. 271) vê semelhanças entre o behaviorismo linguístico e
a gramática generativa e afirma que uma das suas características comuns
consiste em não problematizar devidamente a interacção entre o
organismo e o meio. O autor acrescenta ainda: “Dans les deux cas, la
démarche revient à réduire le langage à un seul de ses aspects,
d'ailleurs appauvri: la communication ou épisode verbal chez Skinner, la
représentation (au sens pré-saussurien) chez Chomsky” (Bronckart et
alii, 1983, p. 271). Por outro lado, é interessante realçar como a
designada revolução chomskyana se processa na continuidade dos métodos
já usados na psicologia experimental (cf. Bronckart et alii, 1983, p.
271).
A segunda geração da PL prepara assim o terreno para os que vêem com
dificuldade a realidade psicológica do modelo linguístico generativo e
com apreensão a sua validação.
Começa então a configurar-se nos anos setenta (cf., de uma forma muito
especial, Bever, 1970) uma nova abordagem (funcionalista) que não só se
apoia na estrutura formal da língua mas também no uso que dela faz o que
a utiliza (Mehler e Noizet, 1974, p. 18). Trata-se de uma abordagem que
viria a dar origem à terceira geração da PL – de que somos ainda hoje
continuadores –, que passa a colocar a tónica nas estratégias
(estratégias perceptivas) utilizadas pelo sujeito no processamento da
informação linguística (cf. Mehler e Noizet, 1974, p. 19).
Quando Slama-Cazacu dedica, em 1983 e em 1985, algum espaço ao termo
“psicolinguística”, diz, a dado passo do artigo de 1983, que, quando lhe
solicitaram que escrevesse sobre o tópico “New methods in linguistic
research”, achou então que termos como “Psychology of language” ou
“Psychological linguistics” não seriam os mais adequados ao novo campo
de pesquisa: a PL. Para a autora, ambos os termos evocavam tanto uma
psicologia como uma linguística obsoletas e ela defendia que esse novo
domínio devia ser autónomo e não devia pertencer em exclusivo nem à
psicologia nem à linguística (Slama-Cazacu, 1983, p. 373). Ao adoptar o
termo “Psicolinguística”, a autora queria evidenciar que a PL americana
não era a única PL, mas unicamente uma das tendências possíveis desta
disciplina. Por outros termos, para Slama-Cazacu, “(our own approach
being opposed to American PL both of the «first generation» — the
behaviouristic one – and of the «second generation» – of the 60s, based
on the generative-transformational linguistics).” (Slama-Cazacu, 1983,
p. 373).
Em parte, a terceira geração da PL acaba por integrar-se (cf. Bronckart
et alii, 1983, p. 271), em alternativa às duas primeiras escolas, no
conjunto de correntes que vêem na linguagem um sistema que toma forma e
se especifica nas interacções sociais.
Em termos de relação, de influência, de dependência entre a psicologia e
a linguística, verifica-se agora a existência de uma via que dá corpo a
uma psicologia linguística, até mesmo a uma linguística psicológica,
nos termos de Mehler e Noizet (1974, p. 19).
O enquadramento da psicologia linguística (da Psicolinguística) – para
uma leitura crítica sobre a terminologia relacionada com este domínio de
pesquisa, ver Slama-Cazacu (1985, pp. 508-509) – na psicologia
cognitiva não se deixa por isso esperar. Por um lado, o comportamento
verbal, como afirmam os autores citados, deixa de ser olhado
isoladamente e passa a ser visto no interior dos processos cognitivos
mais gerais; por outro lado, a psicologia linguística (a
Psicolinguística), ainda de acordo com os mesmos estudiosos, “rétablit
les liens avec la réflexion biologique” (Mehler e Noizet, 1974, p. 20).
Nos anos oitenta, de acordo com Bronckart et alii (1983, p. 273), a PL
encontrava-se dividida em duas opções: a primeira dispunha de todo o
rigor científico “mais se donne des objets d'étude dont le rapport avec
le langage doit être démontré”; a segunda tomava a seu cargo pesquisas
que se baseavam no funcionamento real da linguagem, tanto no aspecto
representativo como comunicativo, em detrimento contudo do rigor
experimental.
Por sua vez, a denominada PL da criança (“psycholinguistique de
l'enfant”) procuraria, segundo os autores em questão, considerar a
linguagem quer como instrumento de representação, quer como utensílio de
comunicação (Bronckart et alii, 1983, p. 273). Neste domínio, como
noutros, uns especialistas privilegiam certas posições e outros outras
(ver Bronckart et alii, 1983, pp. 274 e ss.). Na medida em que ainda se
revestem de grande actualidade, afigura-se interessante transcrever, no
que respeita às teorias linguísticas, as seguintes palavras dos autores:
“les uns rejetant toute formalisation linguistique, les autres
acceptant le modèle chomskyen pour des raisons d'essentialité et
d'universalité, les derniers enfin adhérant aux théories de
l'énonciation” (Bronckart et alii, 1983, p. 275).
Variados modelos de processamento são então construídos e aplicados –
com vista à sua validação e aperfeiçoamento – à compreensão e produção
verbais (normal e patológica, tanto no adulto como na criança) e à
leitura e à escrita (normal e patológica, quer no adulto quer na
criança), com vista a uma compreensão cada vez mais profunda do fenómeno
psicolinguístico. Estudos de ordem neurolinguística e neuropsicológica
(cognitiva) passam a estar também na ordem do dia (cf., entre outros:
Caplan, 1987, 1992; Coltheart et alii, 1980; Coltheart et alii, 1987;
Howard e Hatfield, 1987; Patterson et alii, orgs., 1985). Os modelos
vão-se adaptando a diferentes metáforas que se pretendem cada vez mais
próximas da realidade (biológica?): a arquitectura do computador e a
arquitectura neuronal podem ser dadas como exemplos dessas metáforas
(ver, entre outros: Howard e Hatfield, 1987, pp. 97-107; McClelland,
Rumelhart and the PDP Research Group, 1986; Rumelhart, McClelland and
the PDP Research Group, 1986; Cognition, 28 (1-2), 1988).
A reacção a posições psicolinguísticas que privilegiavam ou a psicologia
ou a linguística só poderia passar a vir daqueles que partiam em defesa
de uma PL autónoma, na qualidade de ciência unitária, “in which
Linguistics and Psychology have already melted together” (Slama-Cazacu,
1995, p. 13), ou seja “an «interdisciplinary science»” (Slama-Cazacu,
1995, p. 13). E se a PL for identificada com uma ciência da comunicação
(ver título da obra de Slama-Cazacu, 1999), nesse caso o objecto é vasto
e o recurso a outros domínios, disciplinas, áreas, ciências, ou
actividades envolvidas na comunicação não pode ser escamoteado (cf.
Slama-Cazacu, 1995, p. 13). (Sobre a comunicação e o século XX, ver Foss
e Hakes (1978, p. xii) e Oléron e Legros, 1994, p. 85.)
Para Bronckart et alii (1983, p. 272), a PL (da criança) também se quer
autónoma e, como referem, para que o estudo seja propriamente
psicolinguístico, entre outros princípios, deve ter em consideração o
“fonctionnement de locuteurs réels” em contextos definidos, com tudo o
que isso pode naturalmente implicar.
Quanto ao termo “psicolinguística”, este surge na literatura enquanto
categoria nome e enquanto categoria adjectivo. Slama-Cazacu, num seu
trabalho de 1965, supunha que estava a traduzir do inglês para o romeno
um termo americano-inglês e que dessa forma o termo estaria a ocorrer
pela primeira vez na Roménia (ver Slama-Cazacu, 1985, p. 508). Na
qualidade de designação de domínio de pesquisa, o termo não ocorrera na
verdade antes em romeno; contudo, como adianta a autora, já teria sido
usado como adjectivo por um autor romeno nos anos vinte (Slama-Cazacu,
1985, p. 508). De acordo com esta autora, o linguista romeno Ovid
Densusianu (1873-1938), que em 1925 participou na organização do 1.º
Congresso de Filólogos Romenos, cujas actas datam de 1926, escreveu
então um artigo (Densusianu, 1926) onde ocorre o adjectivo
"psico-linguístico". Não se sabe muito bem, como adianta Slama-Cazacu,
se terá sido escrito propositadamente com hífen ou se o hífen terá
resultado da translineação operada no texto por necessidade tipográfica.
De qualquer forma, a autora pensa que muito provavelmente as actas do
referido congresso terão tido a divulgação devida e que, por isso, o
termo terá circulado e terá vindo a ser conhecido (cf. Slama-Cazacu,
1985, p. 509). A título de curiosidade, acrescentaria que Slobin (1979,
p. 2) chama a atenção para o nome híbrido do campo e escreve
“PSYCHO-LINGUISTICS” (com hífen), muito embora prossiga afirmando “thus
reflects a truly interdisciplinary endeavor”.
No entender de Slama-Cazacu (Slama-Cazacu, 1985, p. 508), nem mesmo
Pronko (1946), com o seu artigo “Language and psycholinguistics. A
review” terá sido quem escreveu pela primeira vez o termo (ver Titone,
1979, p. 22). A autora acrescenta ainda que Pronko trabalhou na
Universidade de Indiana, a universidade onde se realizou o 1.º Summer
Seminar of Psycholinguistics (1953), seminário que foi precedido por um
outro na Universidade de Cornell em 1951, no qual o termo
“psycholinguistics” não teria aparecido referido. Por outro lado,
recorda a mesma autora (Slama-Cazacu, 1985, p. 509) que, no seminário de
Indiana, estiveram igualmente presentes estudiosos europeus e menciona
ainda o facto de Sebeok, linguista da Universidade de Indiana
directamente envolvido no encontro, ter estudado na Europa até 1937.
Ora, Sebeok, segundo Slama-Cazacu (1985, p. 509), referira que ele e
Osgood “«used the term a lot and were principally responsible for its
propagation»”, não obstante também reconhecer que “«this expression was
in use in the Francophone literature»”.
Estas observações conduzem pura e simplesmente a que se considere de um
modo crítico a criação americano-inglesa do termo “psicolinguística”
(psycholinguistics) pelo grupo de Osgood e Sebeok e com alguma atenção a
sua formação lexical (cf. Slama-Cazacu, 1985, pp. 508 e 509).
No que toca ao termo “psicolinguística”, concluiria com as palavras de
Slama-Cazazu: “It is also possible, however, that the use of the term
psycholinguistics twenty years later in the USA se se tiver em conta a
ocorrência do adjectivo na obra de Ovid Densusianu em 1926 was a mere
coincidence. The fact is all the same more than «interesting», and I
think it should enter the history of the discipline of psycholinguistics
and of linguistics itself” (Slama-Cazacu, 1983, p. 380; 1985, p. 509).
Acrescentaria que os dois trabalhos de Slama-Cazacu (1983, 1985) aqui
citados e dedicados ao termo “psicolinguística” resultaram em parte de
contactos entre a autora e alguns estudiosos neles referidos,
nomeadamente Jakobson e Sebeok. Essa forma de viver a PL explica em
certa medida as seguintes palavras de Slama-Cazacu, escritas em Janeiro
de 1970, em guisa de resposta a Sebeok: “Personnellement, je les plains
déjà: car de cette distance ils seront encore plus perplexes que nous –
qui connaissons un peu mieux certains détails anecdotiques ou
conjoncturaux, en tout cas – par la grande confusion caractérisant
actuellement ce champ.” (Slama-Cazacu, 1972, p. 8), quando Sebeok, no
prefácio à segunda edição (1965) do volume “Psycholinguistics. A survey
of theory and research problems” também organizado por Osgood, datado de
15 de Janeiro de 1965, escreve: “J'envie ceux qui auront l'occasion de
passer en revue les progrès de la psycholinguistique du point de vue de
1975. ” (Slama-Cazacu, 1972, p. 41).
A breve panorâmica da PL aqui traçada, muito embora elaborada, em 2001,
por alguém que conheceu de perto parte dos autores nela incluídos – com
uma referência muito especial a Sebeok e a Slama-Cazacu –, não pode
deixar de transparecer a “perplexidade” que representa optar por um
determinado percurso e não por outro, traduzindo afinal uma posição que
se identifica com as palavras de Slama-Cazacu acima transcritas.
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